São Paulo planeja começar a vacinação de pessoas de 12 a 17 anos nesta quarta-feira (18). Para o Brasil todo, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou ter planos para iniciar a vacinação de adolescentes após todos os adultos tomarem a primeira dose. Os planos seguem as tendências adotadas em outras partes do mundo.
Até o momento, no Brasil, somente a farmacêutica Pfizer recebeu autorização para mudar a bula de sua vacina e incluir os jovens de 12 a 17 anos.
Fora a Pfizer, o Instituto Butantan foi o único a pedir autorização para uso da Coronavac em populações abaixo de 18 anos. Segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o Butantan pediu que a bula do imunizante passe a incluir pessoas de 3 a 17 anos.
A Anvisa diz, em nota, que a sua área técnica está analisando os dados que foram enviados, em 30 de julho, pelo Butantan.
Por fim, a Janssen está conduzindo um estudo, autorizado pela Anvisa, para ampliar a indicação de idade de seu imunizante.
Até o momento, estão autorizados para uso em adultos no Brasil os imunizantes da Pfizer, da Janssen, a Coronavac e a Covishield, imunizante de Oxford/Astrazeneca.
Em outros países, a expansão de idade para aplicação da vacina contra a Covid já vem acontecendo nos últimos meses.
Nos Estados Unidos, o CDC (Centro de Controle de Doenças) recomenda que toda a população a partir de 12 anos deve se imunizar contra a Covid. No país, o imunizante da Pfizer recebeu, em maio, autorização da FDA (agência americana de regulação de drogas) para uso em adolescentes.
Israel, em maio, foi no mesmo caminho ao autorizar a expansão etária para uso da vacina. Com o crescimento de casos no país associado à variante delta, em junho, o ministro da Saúde recomendou que todos de 12 a 15 anos se vacinassem contra a Covid.
A União Europeia, em 28 de maio, também aprovou o uso da vacina da Pfizer e, em julho, o da Moderna para pessoas de 12 a 15 anos.
No início de agosto, jovens com menos de 18 anos de algumas regiões da Espanha começaram a ser imunizados contra a Covid.
No Reino Unido, jovens de 16 e 17 anos devem começar a receber doses de vacina.
Na Alemanha, a imprensa local noticiou, na última semana, um plano do governo para incentivar a vacinação de adolescentes. A preocupação, mais uma vez, é com a variante delta.
"Faz sentido [vacinar pessoas mais jovens], depois que vacinar o último adulto", afirma Renato Kfouri, primeiro secretário da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações). "É o caminho natural em países que têm vacinas e que já vacinaram a população adulta."
Segundo Kfouri, também não se deve esquecer da importância da imunização de adolescentes com comorbidades.
De toda forma, o especialista aponta que, no momento, no Brasil, não há imunizantes suficientes para vacinar, ao mesmo tempo, todos os adultos e adolescentes.
E esse não é um problema só do Brasil.
Os planos de usar imunizantes em adolescentes e para terceiras doses levou a uma manifestação da OMS (Organização Mundial da Saúde) contrária às ideias.
Em maio, Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS (Organização Mundial da Saúde), pediu para que os países que planejavam imunizar crianças e adolescentes destinassem essas doses ao consórcio Covax, coalizão para distribuição mundial de vacinas.
"Em países de renda baixa e média-baixa, o fornecimento de vacinas não tem sido suficiente para imunizar nem mesmo profissionais de saúde", afirmou Adhanom Ghebreyesus.
Desde então, a situação não melhorou e mais um apelo foi feito no começo de agosto, dessa vez com foco na aplicação de terceiras doses. O diretor-geral da OMS cobrou ação do G20, grupo das 20 maiores economias, e afirmou que, enquanto países ricos já aplicaram mais de 100 doses para cada 100 habitantes, os mais pobres têm taxas de só 1,5 dose para 100 habitantes.
"Não é um exagero dizer que a rota desta pandemia depende das decisões tomadas pelo G20", disse Adhanom Ghebreyesus, destacando, mais uma vez, a desigualdade de acesso a imunizantes no mundo.
SEGURANÇA DAS VACINAS
As vacinas aprovadas contra a Covid para crianças e adolescentes, como a da Pfizer, são seguras para essa faixa da população, assim como para as demais para as quais foram também aprovadas.
Nos meses passados, autoridades de saúde americanas e israelenses alertaram para casos raros e leves de miocardite (inflamação no músculo cardíaco) e pericardite (inflamação da membrana que cerca o coração) associados a vacinas que usam tecnologia de RNA mensageiro, como a Pfizer/BioNTech e Moderna. Os casos eram concentrados em jovens e adolescentes, principalmente homens, após a segunda dose.
Kfouri, da SBIm, destaca que os casos documentados tiveram evolução positiva.
"Pode acontecer o efeito adverso, parece estar relacionado", afirma Kfouri. "É uma complicação rara e benigna e, perto do benefício da vacina, continua sendo muito vantajoso."
O CDC também apontou que os benefícios da imunização para maiores de 12 anos superam muito os possíveis riscos.
Em julho, o estudo que mostra a segurança, a imunogenicidade e a efetividade em adolescentes da vacina da Pfizer foi publicado no respeitado periódico científico The New England Journal of Medicine.
A pesquisa, randomizada, com grupo controle e com os pesquisadores cegados, foi feita com 2.260 pessoas de 12 a 15 anos, das quais 1.131 receberam a vacina e 1.129, o placebo. Os efeitos adversos observados foram transitórios e de leves a moderados, como dor no local da injeção, fadiga e dor de cabeça.
No fim de junho, um estudo de fases 1/2 publicado na importante revista científica The Lancet Infectious Diseases demonstrou que a Coronavac é segura e produz resposta imune em crianças de 3 a 17 anos.
A Coronavac foi desenvolvida pela laboratório chinês Sinovac. Ao mesmo tempo em que houve a divulgação dos resultados do estudo em crianças e adolescentes, o governo da China anunciou que iria começar a aplicar a vacina em crianças a partir de 3 anos.
O estudo observou 550 crianças e adolescentes em busca de dados de segurança, tolerabilidade e imunogenicidade (capacidade de gerar resposta imune) de duas doses da Coronavac, com intervalo de 28 dias entre elas, assim como ocorre para outras faixas etárias. A pesquisa foi randomizada, controlada e duplo-cega.
Apesar disso, Kfouri diz que a faixa etária é muito ampla para comparativamente poucas crianças estudadas, o que pode trazer dificuldade para aprovação pela Anvisa neste momento.
ESTUDOS EM DESENVOLVIMENTO
Novos estudos com adolescentes e com crianças -e até bebês- continuam em desenvolvimento e devem crescer, para inclusive aprofundar o perfil de segurança dos imunizantes nessas faixas de idade.
Neste ano, a Pfizer/BioNTech iniciou um estudo de fase 1/2/3 que pretende observar 4.500 crianças de 6 meses a 11 anos. A pesquisa, desenvolvida nos Estados Unidos, Finlândia, Polônia e Espanha, visa descobrir se a vacina é segura e gera resposta imune nessa população. A farmacêutica pode expandir o estudo para idades ainda menores de 6 meses, dependendo da segurança observada.
A farmacêutica planejava apresentar dados sobre crianças de 5 a 11 anos para aprovação de uso emergencial nos EUA entre setembro e outubro.
A farmacêutica Moderna também deve ampliar os seus estudos em faixas etárias mais jovens.
Mas por que são necessários novos estudos específicos em crianças, considerando as grandes pesquisas já publicadas sobre os imunizantes disponíveis?
Como as vacinas são direcionadas, nesse caso, para um grupo que, em teoria, tem menores risco de adoecimento, hospitalização, quadros graves e morte por Covid, é importante ter dados robustos de segurança dos imunizantes, afirma o especialista da SBIm.
"Você não pode submeter uma criança, um adolescente, que tem um risco baixo de hospitalização, a um risco que você possivelmente toleraria em adultos e idosos, que têm possibilidades muito maiores de complicações por Covid", afirma Kfouri. "Quando você tem uma população de menor risco, aumenta muito a importância do quesito segurança."
Além disso, as crianças costumam ter respostas imunes muito mais intensas às vacinas,o que pode possibilitar usos diferentes, como na quantidade de doses, concentração etc, em relação ao indicado para adultos.
Apesar da menor possibilidade de casos graves de Covid em crianças e adolescentes, Kfouri faz um alerta.
"De 0 a 20 anos, respondem por 0,34% pelo total de mortes por Covid no país", afirma. "Só que na hora que você olha para 0,34% de quase 570 mil, estamos falando de quase 2.000 crianças e adolescentes que perderam a vida durante a pandemia."
Apesar de serem proporcionalmente menores os casos e mortes, não é negligenciável a carga da doença na pediatria, diz o especialista. "Nós vamos precisar, sim, vacinar crianças."
Fonte: Folhapress