Cultura Por: Redação Rede Piauí Repórter 03 Dez 2020 15:00 Rede Piauí de Notícias

Escritora de Bodocó (PE) ganha principal Prêmio de Literatura do Brasil

Resultado de dois anos de trabalho, a obra é definida pela poeta e escritora Cida Pedrosa "uma entrega minha ao Sertão, uma conquista que é de todo sertanejo e toda sertaneja”


A poeta e escritora Cida Pedrosa, natural de Bodocó (PE), no Sertão do Araripe, autora de Solo para Vialejo, eleito, na última quinta (24), o livro do ano pelo Prêmio Jabuti, o maior prêmio de literatura do Brasil, lança a obra na sua cidade natal, nesta quinta-feira (3), às 20h, no Sesc Ler, no bairro São Francisco, em Bodocó. Resultado de dois anos de trabalho, a obra é definida por Cida como “uma entrega minha ao Sertão, uma conquista que é de todo sertanejo e toda sertaneja”.

A programação de lançamento vai contar com a Masterclass “Solo para Vialejo”, contando com as presenças de alunos da rede pública de ensino, com quem a escritora irá interagir, falando do processo de composição da obra. Em seguida, acontece o lançamento do livro com coffee break, recital de poesia e apresentações intimistas de artistas locais, seguindo medidas de biossegurança contra a Covid-19.

Eu vivo o Sertão e o Sertão vive em mim. Se eu for para Paris, o Sertão vai comigo”

Cida Pedrosa, poeta e escritora

“Esse prêmio é um marco histórico em minha carreira! Eu me sinto como uma ganhadora da Copa do Mundo! Primeiro, por que ele representa uma vitória dos meus país que hoje já habitam os céus dos sertanejos, que, embora não tivessem sido alfabetizados, me iniciaram na leitura e na escrita como autodidatas, possibilitando que eu trilhasse este caminho. Segundo, por que lançar este livro em Bodocó, junto aos meus familiares que estão retratados no livro, ao lado dos meus conterrâneos,  é um sinal de esperança, é estar no lugar da emoção, na grande fonte de inspiração desta obra”, declara a poeta e escritora com a voz embargada de emoção Cida Pedrosa.

Sobre o livro do ano

Solo para Vialejo, que também foi premiado na categoria poesia, tem 125 páginas e traz, em sua essência, uma voz poética que expressa incompreensão, urgência em ser ouvida. Nele, a musicalidade é um recurso usado para ilustrar o Sertão por meio de ritmos como xote, xaxado, forró e o jazz, representados pela banda Jazz Band União Bodocoense, cuja imagem ilustra a foto da capa. A poeta e escritora sertaneja considera sempre um grande desafio fazer literatura, por isso, a questão de gênero está sempre presente em sua obra. No caso de Solo para Vialejo, ela acredita que havia um ímpeto artístico que a conduziu de forma especial.

“Certo dia, eu viajava de Bodocó para o Crato, quando, de repente, eu senti uma vontade de escrever e, em pouco tempo, produzi dez páginas do livro. Neste período, a força do destino estava mesmo conduzindo a obra, tanto que encontrei, por acaso, uma pessoa que me mostrou a foto da banda Bodocó Jazz Band e eu fiquei feliz por que havia acabado de encontrar a capa do livro”, relembra Cida.

A diagramação de Solo para Vialejo determina a interação com a obra. Para interagir com as poesias e com a sua sonoridade, é importante interagir com a estrutura visual da obra, cujos versos quando lidos em voz alta, ganham outra intensidade. “Esse livro foi feito a quatro mãos. Sempre que eu pensava no conteúdo, chegava para o designer, o meu companheiro, Sennor Ramos, falava da minha inspiração, e ele criava uma estrutura gráfica para potencializar esta leitura” , reforça a poeta e escritora.

O Brasil de olho em Bodocó

Na última sexta-feira, 25, Bodocó acordou nas páginas dos principais veículos da grande imprensa como a terra natal do livro do ano do Prêmio Jabuti. O feito deve incentivar o trabalho com formação em literatura realizado pelo Sesc Ler.  “Que Cida sirva de inspiração para os alunos da cidade. A vinda dela aqui é uma forma de incentivar o surgimento, descobrir e aprimorar novos talentos literários de Bodocó. Para nós, é uma grande alegria termos uma conterrânea, mulher, poeta e sertaneja, conquistando o maior prêmio de literatura do Brasil. Ela mostra a força do Sertão na poesia! Essa força não está apenas nas capitais”, comenta o coordenador de Cultura do Sesc Ler Bodocó, Hebert Adriano.

O Jornal do Sertão conversou com a poeta e escritora Cida Pedrosa, alguns dias após as suas conquistas no Prêmio Jabuti. Nesta conversa, a sertaneja fala da infância e do seu primeiro contato com a poesia e a literatura de cordel. A vinda ao Recife para fazer o curso de Direito, o desafios de ser mulher, sertaneja, poeta, evidenciando o Sertão. Ela também aborda a sua trajetória de produção literária ao longo de toda a sua carreira.

JS: Cida Pedrosa fala um pouco sobre você, quando e onde nasceu? Como era a sua família?

CP: Eu nasci no Sítio Chico Lopes, área rural de Bodocó, em 1963. Sou filha caçula de uma família de agricultores, formada por 21 irmãos, reunindo os filhos do meu pai, tidos em outro casamento. Meu pai se chamava Francisco e a minha mãe Isabel Pedrosa.

JS: Como se deu o seu primeiro contato com a literatura?

CP: A minha mãe era autodidata, nunca foi alfabetizada na escola, mas me ensinou a ler. Quando eu tinha entre seis e sete anos, o meu pai trazia cordéis da feira para mim e nós líamos juntos. Lembro muito bem de seu Zé Pedro, um artesão que fazia contação de história para mim. Ele contava a história encenando e eu viajava naquele universo mágico. Aos 14 anos, eu já estava Recife, havia vindo morar na capital para fazer o curso de Direito, quando comecei a escrever os meus primeiros poemas. Nesta época, os primeiros motes das minha poesias já falavam sobre como as mulheres era subalternas. Eu vivia isso nas ruas, pois quando tinham recitais de poesia na rua Sete de Setembro, no centro do Recife, os homens sempre subiam primeiro nos bancos. Nós, mulheres, ficávamos para depois.

JS: Quando você escreveu o primeiro livro? O tema abordado tinha relação com a desigualdade das mulheres na sociedade?

CP: O meu primeiro livro chama-se Resto do Fim. Usando uma voz infantil, eu falo da luta das mulheres por igualdade e respeito na sociedade. Nesta época e também ao longo de outros momentos da minha vida de poeta e escritora, uma das grandes referências foi a minha irmã, professora e poeta Flôr Pedrosa, de Petrolina,  que me capacitou, nos anos 1979, na área da literatura.

JS: Todas as pessoas sentiram os efeitos desta pandemia, devido ao medo de contrair a doença, devido à distância das pessoas que amamos. Como você vivenciou este momento?

 CP: Ao longo desta pandemia, eu produzir o livro Estesia. Esta obra é a minha expressão sobre este momento. É fruto das minhas andanças e vivências pelo Centro do Recife, ao lado do meu cachorro Bob Marley, vendo as flores, os pássaros, vendo um Recife que ninguém vê. Reuni tudo isso em 40 poemas no formato Haicais, estilo de poesia japonesa, caracterizada pela presença de apenas três versos, sendo o último deles, pentassílabos, ou seja, composto por cinco sílabas poéticas.

JS: Solo para Vialejo é a coroação de toda esta trajetória que você acaba de nos contar. Qual Cida Pedrosa sertaneja ele representa?

CP: Este livro prova que eu sou indivisível. Eu funciono inteira, ou seja, não existe eu e o Sertão. O Sertão sou eu! Esse livro prova que ser mulher e sertaneja é, antes de tudo, construir dentro de si a capacidade de não desistir e resistir.

JS: Claro que a ideia é que os sertanejos possam conhecer Solo para Vialejo, o grande vencedor do Prêmio Jabuti, o maior prêmio de literatura do mundo. Mas, se você pudesse resumir a essência deste livro em um trecho, qual seria?

CP:  Tem vários trechos, mas este é um dos mais emblemáticos: “…negro sei, negro sei… sol sustenido, sol sustenido, … eu sou ser tão assim…” Sobre o Prêmio Jabui Criado pela Câmara Brasileira do Livro em 1958

Fonte: Jornal do Sertão PE.




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